30 junho 2009

INCLUSÃO SOCIAL

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Data: 06/2009
Título: INCLUSÃO SOCIAL
Veículo: Revista Dirigida
Autor: Paulo Chico

Especialistas, das mais diversas correntes, afirmam sem sombra ou sobra de dúvidas. A educação a distância (EAD) é, sim, um instrumento eficaz para a democratização do acesso ao ensino. Mais do que simples tendência, uma revolução que veio para ficar. Mas, se sobram elogios para as possibilidades que ela abre para pessoas à margem da educação formal pela pouca disponibilidade de tempo ou falta de instituições nos municípios do interior, o que dizer da EAD quando o tema é a inclusão dos deficientes?

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB 9.394/96), em seu capítulo V, deixa claro que a educação dos portadores de necessidades especiais deve se dar de preferência na rede regular de ensino, isto é, em escolas comuns. Uma política que permitiria o surgimento de uma nova concepção na forma de entender, atender e integrar essas pessoas à sociedade.

No ensino presencial, é sabido, a realidade conserva severas dissonâncias com o ideal de inclusão previsto em lei. Mas, e na modalidade a distância? “A EAD como modalidade é fundamental para a inclusão social e educacional dos alunos com alguma deficiência física. E é missão do Estado proporcionar soluções para todos. A Fundação Cecierj administra o consórcio Cederj, que reúne as universidades públicas do estado do Rio em cursos ministrados na modalidade semipresencial. Nós possuímos em nosso quadro de alunos e tutores algumas pessoas nessas condições, que têm no ambiente EAD diversas facilidades para acessar com qualidade todo tipo de informação a respeito dos cursos”, afirma Flávio Brito, coordenador do setor Plataforma da Fundação Cecierj. A Plataforma Cederj, coordenada pelo professor, obedece ao padrão internacional do W3C (World Wide Web Consortium) de acessibilidade na Web - uma das mais exigentes do mundo.

No plano de material, também são necessárias algumas adequações, tendo como meta atender às necessidades dos alunos especiais. “No Cederj, até hoje, só houve necessidade de adaptação de material didático e de provas para alunos com deficiência visual. Esse material é devidamente adaptado para o braille”, afirma Tereza Queiroz, coordenadora do setor de Produção do Material Didático Impresso do Cederj. Uma adaptação que não pretende gerar diferenciações, e sim tão somente a igualdade de condições entre estudantes com necessidades diferentes. “Não há qualquer distinção no material, o que representaria exclusão, e nosso objetivo é justamente o oposto, ou seja, incluir. O material didático, embora adaptado quanto a seu formato, tem exatamente o mesmo conteúdo que os materiais não-adaptados”, garante a coordenadora.

E, ainda segundo Tereza Queiroz, são muitos os cuidados que cercam essa operação. “Para avaliar a qualidade do nosso material, constantemente perguntamos aos alunos que o utilizam se estão conseguindo compreender o conteúdo da forma como o apresentamos, se estão conseguindo acompanhar o ritmo das aulas. Este material foi previamente analisado por avaliadores cegos que detectam possíveis problemas, sendo estes corrigidos antes da sua finalização e entrega aos alunos”, conta ela.

Superar a dor, em nome do conhecimento

Faça agora comigo um breve exercício. Imagine-se, então, com uma doença crônica que, se não lhe impede de mover-se, faz com que todos os movimentos sejam feitos à custa de muito esforço e dor. Essa é a realidade de milhares de brasileiros. Esse é o relato de Joana do Nascimento Braga, hoje com 43 anos, mas que aos 13 começou a sentir os sintomas da artrite reumatoide. “No momento a minha principal limitação é de locomoção.
É difícil e doloroso andar, principalmente se tiver que subir escadas. Mas já tive dificuldades até para escrever, quando as minhas mãos estavam afetadas pela doença”, lembra Joana, que utiliza prótese total em ambos os joelhos e no quadril esquerdo, já com indicação de substituição desta última. “Moro numa cidade do interior, Silva Jardim (RJ) e, naquela época, na 8ª série do ensino fundamental, demorou para que eu tivesse um diagnóstico correto e começasse o tratamento. Daí minhas mãos estavam bastante afetadas. Houve algumas ocasiões em que as minhas provas foram orais porque não podia escrever, sentia muita dor. E era muito difícil entrar no ônibus que levava ao colégio. Não sofri nenhum tipo de preconceito. E, mesmo que não se falasse em inclusão naquela época, os professores e colegas sempre me ajudaram muito”, recorda ela. Apesar do apoio recebido na escola, os estudos foram interrompidos aos 18 anos, no final do ensino médio.

Um hiato que durou 24 anos, até que prestasse o vestibular para tentar a graduação no Cederj. “Acho a EAD adequada a todos que não têm tempo disponível para o estudo regular e, sobretudo, para os que têm limitações físicas. Essa foi a única oportunidade que tive de voltar a estudar, pois meu irmão trabalha e só tem disponibilidade de me levar ao polo de Rio Bonito, cidade vizinha, aos fins de semana,quando faço as cadeiras presenciais obrigatórias, previstas no módulo semipresencial”, afirma ela, que aponta impactos do curso em sua personalidade.“Este curso também está me ajudando no aspecto da socialização, pois tinha muito medo de sair sozinha.No início, só ia ao pólo se minha irmã que faz o curso comigo fosse. Tinha medo de cair, vergonha das pessoas. Fiz também o meu primeiro e-mail quando comecei a estudar no Cederj. Eu aprendi a usar a internet por causa do curso”.

A experiência de retomar os estudos e a volta ao convívio social fizeram com que Joana apurasse sua visão sobre a condição dos deficientes na sociedade. “Precisam ser feitas rampas de acesso nos colégios que tenham apenas escadas, os ônibus devem ser adaptados para transportar as pessoas com limitações físicas, com escadas mais baixas para facilitar o acesso ao veículo. As cidades precisam se adaptar para que possamos ter o nosso direito de ir e vir respeitado”, reivindica ela que, além da facilidade de livrar-se do deslocamento na maioria dos dias, ainda conta com a compreensão de professores e tutores do Cederj.“Agora que não posso mais subir escadas, se a prova for aplicada na sala cujo acesso tenha degraus, posso fazê-la na secretaria”, conta ela, que está matriculada na Licenciatura em Matemática. “Ao final do curso pretendo mesmo atuar como professora. E não acredito que terei qualquer tipo de problema com os alunos, devido ao fato de ter algumas limitações físicas”, aposta ela que, logo após a formatura, pretende fazer uma pós-graduação.

A PARTIR DE UMA INDICAÇÃO, A REDESCOBERTA

Tudo começou com a indicação, na verdade uma sugestão, durante conversa informal com uma amiga de sua mãe. Foi mais ou menos assim que Luiz Paulo de Moraes foi parar no curso de Tecnologia em Sistemas de Computação, ministrado no Cederj. “Confesso que fiz a inscrição sem ter informação alguma sobre o que seria o Cederj ou mesmo sobre as características de um curso a distância. Primeiro, achei que não iria passar. Mas passei”, lembra o jovem.

Aos 25 anos de idade, Luiz Paulo é cego desde nascença. Nunca viu a luz do sol. Mas foi na modalidade EAD que enxergou novas possibilidades para sua vida. “Hoje, acho que o curso representa a chance concreta de um futuro melhor para mim. Espero, quando me formar, encontrar um mercado de trabalho acolhedor. E quero investir numa pós ou especialização”, planeja ele, que mora e estuda no polo de Rio Bonito (RJ). Além do fato de não ter que se deslocar com frequência, o jovem, que cursou o ensino fundamental no tradicional Instituto Benjamin Constant, centro voltado para a formação de deficientes visuais, na cidade do Rio de Janeiro, aponta outras vantagens na modalidade EAD. “É bom não estar numa sala de aula lotada, onde o professor não tem como dar atenção a todos os alunos. Hoje conto com o auxílio de um tutor, deslocado para auxiliar os meus estudos. Me sinto mais seguro e até mais assistido na EAD. O Cederj providenciou todo o material em braille, equivalente ao dos demais alunos. Assim, dá para acompanhar as aulas com toda a turma”, festeja ele. Luiz Paulo destaca a boa relação com os demais alunos - “sou apenas mais um dentro do grupo, um estudante comum”, define ele - que deixa uma mensagem final para outros deficientes físicos que, por vezes, se deixam abater pelas dificuldades impostas pela sociedade. “É preciso ter força de vontade, temos que correr atrás. Não dá para ficar esperando que as coisas boas caiam do céu”, ensina.

Sem limites para o saber

Um grave acidente de automóvel. Quase um ano de internação no hospital,seguido por mais de um ano de tratamento em casa. E uma reviravolta na própria vida. Diante das sequelas, a busca de horizontes alternativos, sob a perspectiva de uma nova realidade. Esse é um resumo da história de Ricardo Gonzalez Rocha Souza, jovem de 27 anos que,
após uma batida de carro ocorrida em 1997 na Barra da Tijuca, bairro da Zona Oeste do Rio, encontrou no ensino a distância uma forma de reaproximar- se da vida. “Esse trauma representou uma mudança radical. Meus estudos e minha vida social foram radicalmente interrompidos. O processo para me reabilitar física e emocionalmente levou cerca de três anos”, recorda ele, que ficou tetraplégico no episódio. “Tenho consciência de que, se não me fosse dada a oportunidade do ensino a distância, dificilmente eu teria conseguido retomar os meus estudos”, lembra Ricardo que, hoje, graças às sessões de fisioterapia, já possui condições de locomoção com as quais não contava até pouco tempo.

Aluno da primeira turma de Licenciatura em Biologia do Cederj, Ricardo formou-se em 2006. “O modelo do curso, no sistema semipresencial, foi muito conveniente, por não haver a necessidade de deslocamento diário”, conta. Na época, era exigida, em média, a presença uma vez por semana no polo de Petrópolis, onde estava matriculado. “A bem da verdade, não houve necessidade de maiores adaptações, pois a unidade já contava com opções de acesso por rampas e porta largas”, recorda.Em 2008, após prestar uma prova,
Ricardo Souza aventurou-se em Campinas (SP), onde participou de um curso de especialização em Análise de Risco Ambiental na conceituada Unicamp. O próximo desafio já está definido: um mestrado na Coppe/UFRJ, na área de Planejamento Ambiental. “As pessoas com algum tipo de deficiência não podem perder as esperanças, não podem fazer com que as limitações se tornem um impedimento para cultivar os sonhos e buscar realizá-los”, estimula ele, que trabalha numa empresa de soluções e inovações tecnológicas, no Rio de Janeiro.

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