30 maio 2009

Avaliação de EAD

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Data: 05/2009
Título: Avaliação de EAD
Veículo: Revista Dirigida
Autor: Paulo Chico

“É claro que existe reprovação na educação a distância. Aliás, há muita evasão e reprovação”. Tal afirmação, feita pelo professor Zacarias Gama, dá uma pista de como se dá a avaliação na modalidade. “Quando se trata de uma experiência séria, a EAD reproduz regulamentos e critérios da universidade. Ou seja, o aluno tem que compor uma pontuação, cumprir os módulos...”, diz o educador, que ainda faz outra constatação. “Por trás da maioria das reprovações está o equívoco do estudante de que a EAD é um modelo que vai facilitar a vida dele, garantir a sua aprovação de qualquer forma. Ele não tem noção das demandas que a modalidade vai gerar”, afirma.


Outro problema muito comum, enfrentado por boa parte dos alunos que se inscrevem em cursos de EAD, é ter que superar deficiências técnicas. “As pessoas partem da suposição de que o Brasil já está coberto por uma boa rede de energia elétrica, uma rede eficiente de telefonia... O que não é verdade. É complicado, por exemplo, pensar em EAD sem uma boa conexão de banda larga, por exemplo”, destaca ele, que é avaliador de educação a distância do Ministério da Educação.

Função que o obriga a viajar por todo o país. E, por vezes, a se deparar com graves falhas na avaliação dos estudantes. “Há um problema que começa a aparecer agora, com a expansão da EAD: muita gente está aligeirando a avaliação dos alunos. Presenciei, recentemente, uma universidade de grande porte oferecendo cursos em que avaliava os conhecimentos em cinco disciplinas diferentes, dadas num semestre, com uma única prova presencial de dez questões de múltipla escolha. Isto é, duas questões para cada disciplina. E vi esse tipo de prova medíocre em cursos nas áreas do Direito, Engenharia, Pedagogia, e até em Saúde. Não é por acaso que o MEC vem fechando diversos cursos”, diz o professor. Ele ainda faz um alerta. “É preciso cuidado com a mercantilização da EAD, com o risco de uma expansão sem qualidade”, diz Zacarias, lembrando que fato semelhante ocorreu com o ensino superior regular durante os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso. “A EAD, diferentemente do imaginário popular, supõe um alto nível de investimento, com instalações adequadas e corpo bem treinado. Na verdade, ela compreende a reprodução dispersa de um ambiente universitário”, afirma o educador, que tem se assustado ao se deparar com algumas experiências desvirtuadas pelo país afora.

“Tenho visto muitos polos sem sala de estudo, sem bibliotecas, sem uma ambiência universitária, laboratórios ou tutores especializados. Eles costumam ser muito generalistas. Visitei em Roraima uma instituição onde três ou quatro tutores atendiam a todas as disciplinas dos vários cursos oferecidos. Ora, eles são incapazes de tirar uma dúvida específica de um estudante. Se o aluno não consegue, via e-mail ou telefone, contatar o conteudista na matriz, vai ficar com aquela dúvida em aberto. Não vai conseguir absolutamente sair daquilo”, conta ele, que decreta. “Há, por parte de algumas instituições, uma falsificação da aprovação.” Uma prática comum a mitos estudantes, a fraude na apresentação de trabalhos acadêmicos - por vezes copiados de sites da internet - também é verificada na EAD. “É óbvio que existe cópia de trabalhos.

Além disso, há uma proliferação de profissionais e de escritórios que ajudam o aluno a tapear os professores. Fazem a monografia, a dissertação, a tese inteira”, destaca ele que, no entanto, vê meios de combate a esse tipo de ação. “Há como controlar isso, sim. Começa pelo cuidado na construção do instrumental, exigindo uma certa circunscrição do pensamento e da reflexão ao que está sendo trabalhado naquele módulo, naquele momento. Se o aluno está fazendo uso da bibliografia e o modo como ele utiliza esse material. Basta acompanhar o processo como um todo, e não apenas avaliar o produto final. A avaliação na EAD deve ser muito processual, muito à miúde. No modo presencial, tendo conhecimento físico do meu aluno, eu disponho de mais critérios que me levem a ter mais ou menos credibilidade em relação a ele”, explica.

Em linhas gerais, afirma Zacarias Gama, o processo de avaliação na EAD reproduz os mesmos critérios da avaliação presencial. “No Brasil, é muito forte a tendência das teorias de avaliação relacionadas com competência e habilidade, consideradas hoje indispensáveis para uma maior realização do capital. Mas isso é um reducionismo. A escola deixa de se preocupar com a autoformação do aluno, para diversos projetos, permitindo que ele faça escolhas, para impor um único destino em nome do capital”, aponta ele, que destaca especificidades da EAD. “A modalidade dá grande liberdade, autonomia e estimula uma postura pró-ativa do aluno, a ponto de já aceitar ações de autoavaliação dos estudantes.” Formado em História pela UFF, mestre em Educação pela PUC Rio e doutor em Educação pela UFRJ, Zacarias descreve, enquanto avaliador, a principal característica de um bom curso EAD.

Uma dica valiosa quando da opção por esta ou aquela instituição de ensino. “O que há de mais genial é quando o oferecedor do curso EAD faz convênios com faculdades ou universidades bem instaladas. Assim, o aluno tem a especificidade da sua modalidade de ensino, mas vivendo num ambiente universitário, numa profusão de conhecimento, que sempre enriquece o chamado currículo oculto.” O especialista faz, é claro, o contraponto. “As piores experiências são quando o indivíduo que comprou o ‘franchising’ não tem cuidados, sequer sabe o que é uma universidade. E as instalações são precárias até mesmo para uma escola do ensino básico”, dispara ele, um dos fundadores do Cederj, onde também é professor.

Para encerrar, Zacarias dá o caminho das pedras para uma avaliação eficiente na EAD. “É preciso que o professor esteja atento não só aos saberes que considera necessários, mas também à articulação de idéias e à consistência teórica do aluno. Verificar se ele está de fato construindo um pensamento e uma escrita em nível acadêmico.” Ainda sobre avaliação, Zacarias Gama faz a defesa de um novo modelo, por ele até considerado utópico. “Há muita coisa boa nos referenciais tecnicista e científico. O subjetivismo também tem seu valor: as provas abertas, redações e dissertações são ótimas. Mas é preciso verificar qual concepção de mundo está sendo trabalhada.

A grande questão, hoje, não está mais no instrumental aplicado na avaliação, mas sim na teoria. A escola, sobretudo aquela voltada para as classes populares, precisa trazer critérios que permitam a leitura alternativa de mundo. Se ela for burguesa, pode usar qualquer instrumento para manter o sistema como está. Adoraria que as avaliações sempre valorizassem o ponto de vista e permitissem a objetividade da classe popular”, defende.

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